domingo, 29 de junho de 2008

Destino

Nunca fui muito de acreditar em destino. Sempre me recusei a aceitar que a minha vida não passa de uma história já contada que ainda estou a viver. Sempre me recusei a aceitar que a monotonia anestesiante da minha vida não é mais que uma piada de café entre dois deuses embriagados no Bar do Fim do Tempo.

Mas não sou um ávido defensor do poder do empreendimento humano. Longe disso. Sempre achei que a quantidade de pessoas que morrem todos os anos atingidas por raios é uma prova bastante irrefutável dos limites da auto-confiança.

Não, não tenho dúvidas que existem forças superiores a mim mesmo, forças que me controlam, limitam, prendem o meu corpo e o mantêm bem longe dos céus onde a minha mente flutua. Sou demasiado racional para não conceber o conceito de limites naturais. Simplesmente não consigo ver ordem nessas forças, só caos. Completo, denso e irredutível caos.

No entanto, apesar do turbilhão emocional que se apodera do meu coração a cada segundo que passa, sempre mantive uma atitude exterior de obsessiva organização e necessidade de controlo. Uma gola torta na camisola de alguém à minha frente é o suficiente para arruinar a minha boa-disposição. Tal como um garfo ligeiramente desalinhado numa mesa, de outro modo, perfeita. O mundo à minha volta tem de estar perfeito. E essa perfeição tem de ser definida por mim.

Esta minha crença no caos das forças exteriores é, portanto, constantemente interpretada como um paradoxo numa pessoa que regimenta a sua vida de uma forma tão obsessivamente ordenada, mas nunca achei que fosse. Na verdade, considero que a predominância da minha própria ordem pessoal é a grande razão porque não consigo aceitar qualquer outro tipo de ordem. A Natureza é um limite do corpo. Deus é um limite da mente.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

The Death Of A Modern Man

"A Modern Man"

«I'm a modern man, a man for the millennium, digital and smoke free. A diversified multicultural postmodern deconstructionist, politically, anatomically and ecologically incorrect. I've been uplinked and downloaded. I've been inputted and outsourced. I know the upside of downsizing. I know the downside of upgrading. I'm a high tech lowlife. A cutting edge state-of-the-art bicoastal multitasker, and I can give you a gigabyte in a nanosecond.

I'm new wave but I'm old school, and my inner child is outward bound. I'm a hot wired heat seeking warm hearted cool customer, voice activated and biodegradable. I interface from a database, and my database is in cyberspace, so I'm interactive, I'm hyperactive, and from time-to-time, I'm radioactive.

Behind the eight ball, ahead of the curve, riding the wave, dodging a bullet, pushing the envelope. I'm on point, on task, on message, and off drugs. I got no need for coke and speed, I got no urge to binge and purge. I'm in the moment, on the edge, over the top, but under the radar. A high concept, low profile, medium range ballistic missionary. A street-wise smart bomb. A top gun bottom feeder. I wear power ties, I tell power lies, I take power naps, I run victory laps.

I'm a totally ongoing bigfoot slam dunk rainmaker with a proactive outreach. A raging workaholic. A working rageaholic. Out of rehab, and in denial. I got a personal trainer, a personal shopper, a personal assistant, and a personal agenda. You can't shut me up, you can't dumb me down. 'Cause I'm tireless, and I'm wireless. I'm an alpha male on beta blockers.

I'm a non-believer and an over-achiever. Laid back but fashion forward. Up front, down home, low rent, high maintenance. Super size, long lasting, high definition, fast acting, oven ready, and built to last. I'm a hands on, foot loose, knee jerk, head case. Prematurely post traumatic, and I have a love child who sends me hate mail.

But I'm feeling, I'm caring, I'm healing, I'm sharing. A supportive bonding nurturing primary care giver. My output is down, but my income is up. I take a short position on the long bond, and my revenue stream has its own cash flow. I read junk mail, I eat junk food, I buy junk bonds, I watch trash sports. I'm gender specific, capital intensive, user friendly, and lactose intolerant.

I like rough sex. I like tough love. I use the f word in my email, and the software on my hard drive is hardcore, no soft porn. I bought a microwave at a mini mall. I bought a minivan in a mega store. I eat fast food in the slow lane. I'm toll free, bite sized, ready to wear, and I come in all sizes.

A fully equipped, factory authorized, hospital tested, clinically proven, scientifically formulated medical miracle. I've been pre-washed, pre-cooked, pre-heated, pre-screened, pre-approved, pre-packaged, post-dated, freeze-dried, double-wrapped, vacuum-packed, and I have an unlimited broadband capacity.

I'm a rude dude, but I'm the real deal. Lean and mean. Cocked, locked and ready to rock. Rough tough and hard to bluff. I take it slow. I go with the flow. I ride with the tide. I got glide in my stride. Drivin' and movin', sailin' and spinnin', jivin' and groovin', wailin' and winnin'. I don't snooze, so I don't lose. I keep the pedal to the metal, and the rubber on the road. I party hearty, and lunch time is crunch time.

I'm hanging in, there ain't no doubt. And I'm hanging tough, over and out».

George Carlin (1937-2008)

terça-feira, 24 de junho de 2008

Os Jovens Adultos

Olha para eles. Nenhum com mais de 25, 26 anos, cansados, explorados, ansiosos por poderem parar de fingir que percebem o que estão a fazer neste mundo. Vestidos em fatos caros que não condizem com os seus ares sonhadores e distantes, olham para o fundo do seu terceiro copo de whisky na esperança que a anestesia nebulosa da primeira bebedeira do fim de semana os ajude a esquecer a profunda falta de propósito a que as suas vidas chegaram. Morto que está o romance com o conceito do “primeiro emprego”, não pensam agora em mais nada que o tempo a passar. Quantas horas para ir para casa? Quantos dias para o fim de semana? Quantos meses para as férias? Quantos anos para a reforma?

Triste sina a dos jovens adultos. Sem tempo para serem jovens e sem dinheiro para serem adultos.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Diários

Lembrou-se de uma conclusão a que tinha chegado há cerca de cinco anos atrás (aquela altura da sua vida em que achava que era verdadeiramente possível chegar a qualquer tipo de conclusão): não tinha jeito para escrever diários. Sempre que tentou, em criança, escrever um diário, cansava-se a meio e nunca escrevia nada que tornasse o papel mais que futuro material de reciclagem. Ao ler o que havia escrito, apercebeu-se que, pelo contrário, não conseguia escrever nada que não fosse, de uma forma ou de outra, uma espécie de diário – um diário escrito em balas e colorido a sangue.

Desde pequeno que se isolava no seu mundo de histórias e crimes. Em muitas conversas na esplanada da sua faculdade havia-se esforçado por fornecer os seus amigos (e a sua própria psique confusa) com explicações freudianas de expiação de sentimentos e frustrações através da escrita – de como a sua escrita, violenta e sarcástica, era uma forma de reagir às atrocidades sociais de uma forma que os seus códigos de conduta não lho permitiam. Mas a verdade (esse monstro indestrutível que mais do que procurar ele se esforçava por evitar) é que era um homem (?) muito só. Tinha muitos amigos, mas isso é um factor totalmente alheio ao sentimento de solidão.

Penso que só quem já alguma vez se sentiu realmente só pode compreender na totalidade a natureza destrutiva da solidão. Aquele frio permanente a percorrer o estômago lembrando-nos constantemente de que ninguém nos ama. Não interessa que alguém nos diga eventualmente o quão especiais nós somos. Ao fim de algum tempo de exposição a este sentimento, ganha-se uma consciência, racional, de que ele nunca vai terminar. Estabelecemos uma relação obsessiva com o nosso coração (ou assim nós julgamos, pois ao fim de algum tempo este deixa de conseguir impor os seus desígnios face ao jugo tirânico do cérebro) e procuramos incessantemente a saída. Mas não a encontramos. Pois na solidão só encontramos mais solidão. Cada pessoa que nos ignora (ou simplesmente prefere outra) empurra-nos cada vez mais para dentro do nosso próprio casulo.

Era essa a razão porque escrevia as suas histórias – não para expiar sentimentos mas para os sentir. Porque na solidão não há alegria, tristeza, alívio, medo, nada – apenas solidão. E porque a sua obsessão auto-depressiva havia incapacitado de tal forma a sua capacidade de se relacionar, social ou espiritualmente, consciencializou-se que a única forma de chegar aos sentimentos era ir além deles, apanhá-los na sua forma de expressão artística. Sabia perfeitamente que não passavam de simulacros auto-induzidos – mentiras cósmicas disfarçadas de palavras. Mas também sabia que eram a única coisa que o mantinha vivo.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Irrita-me

Irritam-me pessoas que me perguntam qual é a minha fantasia sexual favorita. No que me diz respeito, fazer sexo já é fantasia suficiente.

Irritam-me tops com coisas escritas. Como se eu precisasse de mais uma desculpa para olhar na direcção do decote de uma mulher.

Irrita-me não conseguir parar de cantar músicas de filmes da Disney sempre que bebo um copo a mais. Irrita-me que o fruto do meu vizinho pareça melhor que o meu e que o seu sonho de ir lá em cima, eu creio, é engano seu. Irrita-me que a minha cultura musical disparatadamente eclética tenha o condão de atrair amigas e repudiar namoradas.

Irrita-me que tão poucas pessoas compreendam o valor e investimento emocional em passar uma noite inteira sem dormir por causa de um videojogo. E irrita-me que os que compreendem, lhe dêem demasiado valor e investimento emocional.

Irrita-me ver modelos a dizer que só querem um homem com sentido de humor. Se o George Clooney anunciasse ao mundo que era um pedófilo ninfomaníaco com um fetiche por borracha e que gosta de fazer sexo com animais mortos, 90% da população mundial continuaria a achar isso charmoso. E muito mais atraente que qualquer piada minha.

Irrita-me ter de me vestir de preto para ouvir um concerto de Metallica. Irrita-me que todas as “contra-culturas” tenham códigos de vestuário, hinos oficiais e falsos profetas.

Irrita-me quem acredita que Deus precisa de rituais pré-fabricados para aceitar a tua fé. Irrita-me quem acredita que um ser perfeito possa ser tão superficial e mesquinho. E odeio quem os fez acreditar nisso. Irrita-me que não acreditar em Deus não passe de outra forma de religião. Irrita-me não acreditar em Deus. A minha vida podia ser tão mais fácil.

Irrita-me esta tendência de considerar que ser culto é ser arrogante, e pessoas que acham que tirar um curso universitário não é mais que passar meia década em coma alcoólico. E depois irrita-me ver pessoas com cursos universitários a dizer “Ra-X” e a darem-lhes razão.

Irritam-me pessoas que dizem que não se interessam por política, mas depois se queixam de como não são representadas. Que gritam injúrias abafadas sobre a exploração dos seus patrões, mas depois desprezam quem faz greve em protesto.

Irritam-me pessoas que acham que não votar é o mesmo que votar em branco. Como se não conseguir sequer tirar o cu do sofá para ir buscar uma cerveja à cozinha fosse alguma forma de rebeldia contra o sistema.

Irritam-me pessoas que dizem não ser de esquerda nem de direita, com medo que de algum modo sejam vistos como “políticas” e, como tal, parciais. Irrita-me que política e retórica se tenham tornado palavras feias. Irrita-me que conservadorismo não seja. Irritam-me liberais com medo e fascistas com coragem a mais. Irritam-me minorias que votam à direita. Não compreendo mulheres que votam à direita. Irrita-me que uma “minoria” de 51% ainda seja silenciosa. Irrita-me ainda mais que quando as minorias quebram o silêncio não sabem falar sobre mais nada que sobre a sua condição de minoria. Irrita-me não ter forma de compreender por que o fazem.

Irritam-me todas as pessoas que me vão dizer que eu tenho “queda” para isto depois de lerem este texto. Irritam-me pessoas que gostam de humor fácil porque são burras e ainda mais as que gostam de humor fácil porque não percebem que isso não é ser irónico.

Irritam-me pessoas que insistem em repetir o mesmo comentário vazio na esperança que se torne mais interessante pela repetição. Irrita-me que não percebam a figura triste que estão fazer. Irrita-me pensar coisas tão cruéis sobre os outros.

Irrita-me fazer tudo pelos outros e nada por mim. Irrita-me ser convencido ao ponto de achar que faço tudo pelos outros mas pessimista o suficiente para achar que não faço nada por mim.

Irrita-me sentir a compulsão de pedir desculpa sempre que alguém me pisa na rua e continua a andar sem dizer uma palavra. Irrita-me ficar irritado por ser bem-educado.

Irrita-me que respeitar o próximo seja considerado fraqueza e ser um atrasado mental honestidade. Irrita-me que só saibamos utilizar a liberdade para gritar obscenidades. Irrita-me quem acha que só os carecas tatuados é que são racistas.

Irritam-me pessoas que acham que é preciso acontecer algo de mau para eu me deprimir. Irrita-me quem não compreende esta minha maneira de ser. Irrita-me quem não me compreende. Irrita-me saber tudo e não compreender ninguém.

Irrita-me nunca chorar. Irrita-me ainda mais não saber se isso é um motivo de orgulho ou embaraço.

Irrita-me saber que não vou chegar a lado nenhum sem ajuda. E irrita-me que isso me irrite. Irrita-me que isso me irrite.

Irrita-me só ter coragem para dizer o que penso e nunca o que sinto.

E irrita-me já ter sido suficientemente fraco para ter feito quase tudo aquilo que me irrita.

sábado, 14 de junho de 2008

The End

Nunca consigo começar a escrever nada sem pensar antes como vai acabar. Portanto aqui vai:

RIP

Pedro Quedas
AKA "O Bravo"

Amigo eterno
Deixa um manancial virtualmente interminável de comentários sarcásticos por fazer

(1982-2082)